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A Universidade de Coimbra justificou da seguinte maneira o título de Doutor Honoris Causa ao cidadão Lula da Silva: “a política transporta positividade e com positividade deve ser exercida. Da poesia para o filósofo, do filósofo para o povo. Do povo para o homem do povo: Lula da Silva”

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domingo, 19 de setembro de 2010

Crônica de domingo: Ele, Ely, é o cara

Ely é o segundo da esquerda para a direita.

Parece estranho encontrar no Brasil gente que entende inglês – uma planta estranha ao país – e que não reconhece frases em pelo menos uma ou duas das atuais 188 línguas indígenas - plantas nativas do nosso solo.

Por José Ribamar Bessa Freire (*)



Prezado leitor (a), me responde rapidinho:
- Do you know mister Ely?
Hein? Essa não é a língua usada no Brasil? Estou falando língua de gringo? Oh, my god, why do you sempre me phode? Tudo bem! Então vou facilitar, traduzindo para um idioma nosso, do tronco tupi, falado, cantado e rezado há mais de dois mil anos aqui nesse chão que nós pisamos. Ai vai a mesma frase em língua guarani:
- Reikuaa pa Ely?
E agora? Se você não entendeu bulhufas, então tem alguma coisa errada. Afinal, o guarani é uma língua enraizada no Brasil profundo. Hoje, essa pergunta seria entendida em mais de cem municípios de dez estados do nosso país, onde vivem milhares de falantes dessa língua, mas também dentro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que na última quarta-feira iniciou um curso de língua guarani ministrado pelo professor indígena Alberto Tupara’y e pela linguista Ruth Monserrat. Lá falamos e cantamos em guarani.
O que acontece se eu formular a mesma questão em macuxi:
- Ely epuinen amîrî?
Deu pra compreender? Essa frase, que para nós é grego, pode ser facilmente entendida por milhares de pessoas que vivem em Roraima e que falam macuxi, uma língua do tronco Karib. Parece estranho encontrar no Brasil gente que entende inglês – uma planta estranha ao país – e que não reconhece frases em pelo menos uma ou duas das atuais 188 línguas indígenas - plantas nativas do nosso solo.
No entanto, todo mundo entende o português que, embora seja uma língua neolatina transplantada da Europa, criou raízes históricas aqui, nos últimos cinco séculos, incorporando marcas indeléveis das línguas indígenas com as quais manteve contato. Que o diga o carioca de Ipanema ou de Irajá – três palavras de origem tupi. Sendo assim, reformulo a pergunta na língua nacional que é, em certa medida, a língua de Camões, do Lula, da Marina Silva, do Saramago, do Joel Santana e do caspento Cristiano Ronaldo.
- Você conhece o Ely?
Um guarani responderia: Ha’e xeirŨ porã ete. Um Macuxi não hesitaria em confirmar a mesma coisa em sua língua: Morî pu'kuru mîîkîrî pemonkon. O que eles querem dizer? Mistério que só revelo depois de apresentar o Ely.
Não sabia voar
Ele é o Ely. Ely Macuxi. Ely Ribeiro de Souza, índio macuxi., professor concursado de História da rede pública de ensino em Manaus, ex-gerente de Educação Escolar Indígena na Secretaria Municipal de Educação, docente de antropologia na UNINTER e assessor de diversas organizações indígenas no Amazonas: Coiab, Copiam, CEEEI, Amarn, Wotchimaucu.
Estive em vários encontros de escritores indígenas com Daniel Munduruku, Eliane Potiguara, Álvaro Tukano, Cristino Wapixana, Rosi Waikhon e tantos outros, onde Ely mostrou os contos que escreveu: Ypaty, o curumim da selva; o passarinho que não sabia voar; a menina e o purupuru. Ele, Ely, escreve muito bem. Concluiu seu curso de graduação em Filosofia e partiu para a pós-graduação. Fez o Mestrado em Sociedade e Cultura na Amazônia e especialização em Gestão e Etnodesenvolvimento, ambos na UFAM – Universidade Federal do Amazonas. O cara é bem preparado.
Ele, Ely, é o cara, porque sua experiência profissional, seus estudos e seus escritos vêm acompanhados de um compromisso inarredável com as lutas sociais. Ele, Ely, é líder comunitário no bairro de Santa Luzia, onde coordenou atividades de pastoral. Atuou ainda como dirigente sindical no Sindicato dos Trabalhadores de Ensino no Amazonas e como lutador incansável no movimento indígena organizado.
Por isso, recebeu apoio político de lideranças, caciques e tuxauas, vereadores e prefeitos indígenas em pelo menos 15 municípios do Amazonas. As comunidades indígenas urbanas de Manaus também o apoiam: os Ticuna da Cidade de Deus e do Mauazinho, os Sateré Mawé do bairro Santos Dumont, os Apuriná do Alvorada e Lírio do Vale, os Tukano do Aleixo.
Da mesma forma, tem gente boa que o apoia nas comunidades indígenas da zona rural: os Kambeba da Comunidade Brasileirinho; os Baré e os Tukano de Terra Preta; os Karapanã de Canaã; o pessoal da comunidade do Tupé – Baré, Tukano e Piratapuia. Além de alguns intelectuais amazonenses renomados como Thiago de Mello, Tenório Teles, Raimundo Nonato Correia e outros.
Zagallo e Belão
Na história do Amazonas nunca elegemos um deputado indígena capaz de defender os interesses de diferentes povos de línguas diversas, mas capaz também de representar – é o caso do Ely - os interesses de quem, não sendo índio, sofre com os problemas ambientais, de educação, saúde, saneamento básico. Ele, Ely, está comprometido com todas essas causas. Sua eleição é uma questão de honra para todos nós.
Lembro aqui – e morro de vergonha – daquela infame sessão da Assembleia Legislativa do Amazonas, em 2006, quando o presidente da Casa, Belarmino Lins – o Belão – discutiu com Francisco Balieiro. Os dois se xingaram com os mais escabrosos palavrões: biltre, canalha, patife, escroque, pulha, filho duma égua, sacripanta, efedepê. Estava empate, até que Belão ganhou quando fulminou o colega cuspindo-lhe na cara o que ele considerou como o insulto mais desqualificador: - “Índio”. A palavra soou como uma bofetada – “É a mãe” – respondeu Balieiro, ofendido.
O índio, até agora, só entrou na Assembleia Legislativa como ofensa., pela porta dos fundos Agora tem que entrar como proposta, como luz, como resistência. A melhor resposta que o eleitor amazonense pode dar ao Belão, ao Balieiro e à cambada dos que têm vergonha de sua ascendência baré é eleger um deputado indígena, para que ele entre naquele mesmo recinto onde todos nós amazonenses fomos xingados e humilhados. E inicie seu discurso de posse com um “bom dia, senhores deputados”, em língua Macuxi ou em Nheengatu.
O número do Ely é fácil de guardar: basta lembrar o Zagallo, amante do 13, e o Belão. Primeiro você lembra o Zagallo e escreve 13. Depois, lembra o Belão e coloca um zero à esquerda – 013. Depois volta a se lembrar do Zagallo: 13013.
Agora, leitor (a) se um gringo te perguntar: - Do you know mister Ely? Responde: Yes, now I know. E tasca em guarani: Ha’e xeirŨ porã ete. Ou em macuxi: Morî pu'kuru mîîkîrî pemonkon. O que quer dizer, em ambas as línguas: ele é muito bom, ele é o cara! (tradução do guarani por Alberto Tupara’y e do macuxi por Celino Raposo, Coordenador da Licenciatura Intercultural de Roraima).
O leitor amazonense, generoso, vai perceber que esse é o momento histórico importante para eleger Ely, o Cara: 13013 (Lembra: Zagallo Belão Zagallo). Se estou fazendo propaganda eleitoral gratuita? É. É isso mesmo. Trata-se de declaração de voto gratuita, entusiasmada, escancarada e consciente em prol de uma representação indígena na Assembleia Legislativa do Amazonas.
- Ely epuinen amîrî?
Responde, eleitor (a), com teu voto:
- Morî pu'kuru mîîkîrî pemonkon.
P.S. – Minhas muitas irmãs, meus inumeráveis sobrinhos, meus poucos amigos, meus inteligentes ex-alunos, meus escassos leitores, votem por mim, já que meu título de eleitor não é do Amazonas. Lembre, ele, Ely Macuxi, o Cara, número 13013 (Zagallo Belão Zagallo).

*José
Ribamar Bessa Freire
é antropólogo, natural de Manaus e assina no “Diário do Amazonas” coluna semanal tida como uma das mais lidas da região norte. Reside no Rio de Janeiro há mais de 20 anos e é professor da UERJ, onde coordena o programa “Pró-Índio”. Mantém o blogTaqui pra ti e é colaborador do blog “Quem tem medo do Lula?”.

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