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A Universidade de Coimbra justificou da seguinte maneira o título de Doutor Honoris Causa ao cidadão Lula da Silva: “a política transporta positividade e com positividade deve ser exercida. Da poesia para o filósofo, do filósofo para o povo. Do povo para o homem do povo: Lula da Silva”

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domingo, 26 de setembro de 2010

VANDRÉ: DILACERANTE

Celso Lungaretti (*)

"Não há por que mentir ou esconder
a dor que foi maior do que é capaz meu coração"
("Pequeno Concerto Que Virou Canção")


Foi um banho de água fria, um anticlímax, o Dossiê Globo News que marcou o reencontro dos telespectadores brasileiros com Geraldo Vandré, aos 75 anos de idade e 37 depois do última e deprimente aparição.

De positiva há a intenção manifestada por ele de retomar as atividades musicais, nem que seja gravando composições em espanhol, num país latino-americano qualquer.

E sua intenção de enveredar por poemas sinfônicos não é  tão despropositada como possa ter parecido para os que ignoram ser ele autor de uma missa apresentada em conventos dominicanos, Paixão Segundo Cristino.

Mas, não foi desta vez que a pergunta do repórter Geneton Moraes Neto – e de todos nós – teve verdadeira resposta: o que aconteceu, afinal, com Geraldo Vandré?

Só nos resta torcer para que o jornalista Vitor Nuzzi, na biografia que logo lançará do cantor e compositor paraibano, consiga desvendar o enigma.

Em primeiro lugar: Vandré foi torturado antes de partir para o exílio?

Há ex-preso político que garante tê-lo visto desmaiado numa sala de tortura. Mas, naquelas circunstâncias tão dramáticas, podia-se tomar uma pessoa por outra, ou confundir imaginação e realidade.

Quando eu estava preso na PE da Vila Militar, ouvi de cabos e sargentos relatos terríveis sobre as humilhações e indignidades a que submeteram Caetano Veloso e Gilberto Gil. Orgulhavam-se de haver colocado “no seu lugar” aquelas “bichas choronas”...

Mas, as torturas brutais não eram decididas por cabos da guarda e carcereiros entediados, e sim pelos oficiais, que as reservavam para os casos em que havia informações a serem arrancadas.

Então, Vandré só haverá sido massacrado se os ressentimentos contra ele, de tão exacerbados, tiverem feito com que recebesse tratamento diferente do habitual.

Pode ser, os militares nunca engoliram a estrofe famosa da “Caminhando”:
“Há soldados armados, amados ou não
Quase todos perdidos, de armas na mão
Nos quartéis lhes ensinam antigas lições
De morrer pela pátria e viver sem razões”
É estranha a seletividade de sua memória, ao reconhecer, p. ex., que se refugiou na casa da viúva do Guimarães Rosa, mas omitir que o então governador de São Paulo, Abreu Sodré, o escondeu no próprio Palácio dos Bandeirantes. Quem me revelou isto, um companheiro jornalista que então atuava na imprensa palaciana, é totalmente confiável.

O certo é que, ou fugiu do País ao receber aviso da Dedé, mulher do Caetano (conforme alega) ou foi preso e depois despachado para o exterior (a versão mais plausível), vagou pelo Chile e pela França, sentiu-se infeliz e amargurado, teve problemas com drogas.

Seu disco francês (Das Terras de Benvirá) é pungente, inventário das dores de uma geração que viu seus sonhos destruídos e pagou altíssimo preço pela derrota. Chega a chorar nitidamente no meio da interpretação.

Mas, ainda era Vandré:
“Eu canto o canto
Eu brigo a briga
Porque sou forte
E tenho razão”
("Vem Vem")
Acabou não agüentando a barra do exílio e, como era usual, teve de negociar com a ditadura as condições de sua volta, para “não ter na chegada/ que morrer, amada/ ou de amor, matar” ("Canção Primeira").

Indagado sobre a entrevista que concedeu de imediato, na qual declarou a intenção de só fazer dali em diante canções de amor, ele agora diz:
“Gostaria de rever as imagens. Houve a gravação. O que foi para o ar, não sei. Queriam que fizesse uma gravação. Não lembro mais. Mas nada disse que não tenha querido dizer. Aquela declaração foi feita a pedido de alguém que se apresentou como policial federal. Fiz um depoimento aqui, no Rio. Depois disseram que tinha que ir para Brasília. Cheguei ao Brasil em 14 de julho. Em 11 de setembro de 1973, apareço como se estivesse chegando em Brasília. O depoimento foi gravado antes. Gravaram minha imagem descendo do avião em Brasília. Tudo muito manipulado. Tive que passar por um processo de readaptação ao voltar”.
A gravação era sempre parte do acordo, previamente combinada, e não “feita a pedido de alguém que se apresentou como policial federal”.

Com Gilberto Gil aconteceu o mesmo. Foi mostrado em pleno aeroporto, declarando: “Não tenho mais compromissos com a História”. Uma variante de “agora só farei canções de amor”. Os serviços de guerra psicológica das Forças Armadas não eram lá muito sutis...

Também não acredito que o depoimento tenha sido prestado a uma produtora independente. Quem costumava cumprir tais tarefas para a ditadura era a própria Globo.

E está inteiramente confirmado que o alegado "processo de readaptação" foi algo bem diferente: Vandré recebeu tratamento psiquiátrico, sob controle da ditadura, nesse período entre 14 de julho e 11 de setembro de 1973. 

Pode-se, sim, levantar a hipótese de lavagem cerebral.

De que, nesses quase dois meses em que o tiveram indefeso em suas mãos, extremamente fragilizado, hajam nele incutido a bizarra devoção pela Força Aérea Brasileira, a ponto de ele compor uma canção homenageando a FAB e de dar agora entrevista em instalações da Aeronáutica, trajando abrigo da Academia da Força Aérea.

Que o tenham condicionado a gostar do  policial bom  faz mais sentido do que uma  síndrome de Ícaro num homem com sua idade e história de vida.

Mas, é claro, trata-se apenas de uma hipótese.
* Jornalista, escritor e ex-preso político. http://naufrago-da-utopia.blogspot.com

Um comentário:

Valdete C. de Andrade disse...

Bom, só nos resta esperar que algum dia desses o Lendário Geraldo Vandré nos conte a sua história. Mas é muito bom ter notícias desse cara, saber que ele está por aí... É isso.
Gostei demais da matéria.

Um grande abraço.

De, Valdete C. de Andrade.

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